Quando eu era pequena, comer era um suplício diário. Mesmo! Lembro como se fosse ontem, a dificuldade que meus pais tinham em me fazer descer três garfadinhas de abobrinha, cebola ou tomate. E para mim, era o horror do meio-dia: horas e horas na frente do prato semiacabado, o relógio marcando lentamente os minutos, a comida remastigada mil vezes, ainda na boca e empurrada a grandes goles d’água ou suco até dar 13h. O ônibus escolar se aproximando da minha casa, uma bronca daquele tamanho e um chororô dramático digno de um Oscar. Choro esse engolido – claro – logo que a porta de casa se abria e que eu avistasse meus coleguinhas. Ufa! Graças a Deus para mim (e para os meus pobres pais que tinham medo que eu acabasse subnutrida) o tempo passou e tudo isso mudou.
Mas não foi do dia para a noite. Tive que atingir a maioridade, deixar o Brasil e morar fora, comer muita porcaria congelada e barata de supermercado até me interessar a me virar na cozinha (com pouca grana) para não pagar mico com os amigos, frequentar gente e lugares diferentes e somente enfim descobrir que comer é bom demais. Bobinha, eu sei… tive que crescer apenas. Pois bem, me voilà – aqui estou, como dizem aqui na França.
Claro que morar em um país referência da gastronomia mundial ajudou. Queijo Brie e vinho bom a preço de banana é melhor, né? Amigos, namorado e a tendência da democratização da comida “gourmet” também tiveram sua parte nesse “upgrade”.
Mas, honestamente, tenho ainda muita coisa para aprender e melhorar. Se alguém quer saber uma verdade bem verdadeira sobre mim, falo com um pouquinho de vergonha e voz tímida: ainda não consigo comer peixes cozidos, nem alguns frutos do mar. Nem pimentas e pimentões: difícil de digerir. Chocolate e doces em geral não me fazem a menor tentação. Ah, miúdos também não são muito a minha praia. Porém, eu sei que pouco a pouco meu paladar vai mudando, se renovando e, sobretudo, minhas viagens me ajudam bastante a evoluir.
E é disso que eu quero falar aqui. Quero dividir com você, nessa coluna, as minhas experiências. Aprendizados, sabores, cheiros e texturas que vou encontrando nos caminhos desse mundão velho que tenho tentado explorar aos poucos e em fragmentos. Quero também contar das descobertas singelas do dia-a-dia, dos pequenos cantos espalhados pela cidade onde eu vivo – e que brotam como cogumelos nesse terreno fértil que é Paris. E porque não, dividir também os personagens, os encontros e a poesia da vida que tenho levado, ou melhor, que me leva por aí…
Então, vamos?